Será que é orgânico?

Sylvia Wachsner, especialista no assunto, esclarece dúvidas sobre esses produtos para o MeuCardápio.

Muito se tem falado dos alimentos orgânicos e de seus benefícios. Mas você sabe o que é preciso para que um alimento seja considerado orgânico e como identificá-lo? Os produtos orgânicos não só têm de ser produzidos sem a utilização de agrotóxicos, como também é proibido o uso de organismos geneticamente modificados. Nas prateleiras, eles podem ser reconhecidos por um selo que certifica que o produtor segue o que determina a Lei de Orgânicos criada em 2003.

Quando vendido a granel também devem estar identificados e, caso haja dúvidas, pode-se consultar o Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos, orienta a especialista Sylvia Wachsner, coordenadora do Centro de Inteligência em Orgânicos da Sociedade Nacional da Agricultura (SNA).

Essa produção tem avançado em quantidade e qualidade e tem o mesmo tamanho e aspecto dos alimentos tradicionais, diz Sylvia. “Os vegetais convencionais grandes muitas vezes são maiores devido ao uso excessivo de fertilizantes”, alerta. Sylvia informa que desde o último trimestre do ano passado o Ministério da Agricultura tem analisado amostras desses produtos para identificar possíveis falhas. Abaixo alguns trechos da entrevista concedida ao site MeuCardapio:

MC: O que é necessário para que um produto seja considerado orgânico?

SW: Eles são produzidos sem a utilização de agrotóxicos (inseticidas, herbicidas, fungicidas, acaricidas, nematicidas) ou demais insumos artificiais tóxicos como adubos químicos altamente solúveis. Em sua produção, é proibida a utilização de organismos geneticamente modificados – OGM/transgênicos ou de radiações ionizantes. Logo, são isentos de quaisquer resíduos de agroquímicos prejudiciais à saúde humana e animal.

São mais seguros para o consumidor e não contaminam o meio ambiente. A produção preserva a diversidade biológica dos ecossistemas naturais, com a sua recomposição ou incremento. São adotadas práticas que contemplam o uso saudável do solo, da água e do ar, para reduzir ao mínimo todas as formas de contaminação e desperdício desses elementos. Os produtos orgânicos são certificados, ou seja, a produção atende à legislação brasileira.

Já a produção convencional não é certificada. A agricultura orgânica combina tradição, inovação e ciência para beneficiar o meio ambiente, promover relações justas de trabalho e proporcionar qualidade de vida para todos os envolvidos.

MC: Como o consumidor pode saber que está consumindo um produto realmente orgânico?

SW: Para que um produto seja considerado orgânico, ele deve atender a todos os princípios estabelecidos na Lei Federal 10.831 de 23 de dezembro de 2003, conhecida como a Lei dos Orgânicos. A identificação do produto é feita por meio de um selo que é colocado à frente da embalagem. A certificação pode ser por auditoria ou participativa. As entidades certificadoras e os sistemas participativos de garantia atestam que todos os padrões da legislação orgânica foram seguidos.

Os agricultores familiares que oferecem seus produtos para venda direta, nas feiras municipais, ao consumidor, ou que atendem os programas da merenda escolar e compras do governo – Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) – devem estar cadastrados no Ministério de Agricultura (Mapa).

O desenvolvimento do mercado orgânico depende da confiança dos consumidores na autenticidade da certificação. Os produtos comercializados no varejo devem levar, na rotulagem, o selo federal de certificação. A regulação aplica-se aos produtos nacionais ou estrangeiros. Os produtos que são comercializados a granel também devem estar devidamente identificados.

MC: E no caso da alimentação fora de casa?

SW: Os restaurantes, lanchonetes e hotéis que servem pratos orgânicos ou pratos com ingredientes orgânicos, devem, conforme a legislação brasileira, manter à disposição dos consumidores listagens com os nomes dos fornecedores dos ingredientes que foram utilizados nas refeições.

MC: Como essa produção tem evoluído?

SW: A produção orgânica de hortigranjeiros tem sido incrementada nos últimos anos, não somente pelo número crescente de produtores, como também pela quantidade e qualidade. Esse incremento significa que cada vez mais encontramos produtos orgânicos com cores mais fortes – hortaliças com mais brilho, mais textura, que os distinguem dos similares convencionais. Os produtos orgânicos têm o tamanho e o aspecto dos alimentos tradicionais. Os vegetais convencionais grandes muitas vezes são maiores devido ao uso excessivo de fertilizantes. Renomados chefes brasileiros preferem escolher para seus pratos produtos orgânicos por causa do sabor, e muitos têm suas hortas e compram diretamente dos produtores.

MC: Existem diferenças nas características nutricionais desses produtos?

SW: Os vegetais produzidos de forma orgânica tendem a ter um conjunto de características que se refletem num valor nutricional mais equilibrado, muito influenciado pela melhor qualidade do solo no qual são cultivados. Um solo bem nutrido produz uma planta mais equilibrada, e isso reflete no alimento que as pessoas ingerem. Existem pesquisas que mostram tendências positivas para os teores de vitamina C, maior teor de matéria seca, maior teor de fotoquímicos – como carotenóides e polifenóis (que os vegetais produzem para se defender de pragas e doenças e que são responsáveis pela proteção do organismo), além de menor quantidade de nitratos e resíduos químicos em geral. As plantas cultivadas dentro dos princípios da agricultura orgânica tendem a produzir mais compostos (fotoquímicos) benéficos à saúde humana. Vale lembrar que essas plantas não são adubadas com fertilizantes sintéticos, nem pulverizadas com agrotóxicos.

MC: Os orgânicos duram mais tempo na geladeira?

SW: As regras de manipulação dos alimentos devem ser seguidas antes de colocá-los na geladeira. Se bem tratados, a durabilidade dos alimentos orgânicos é maior.

AINDA MAIS CAROS

MC: Qual a diferença média de preço entre um alimento convencional e o orgânico?

SW: Como média, estima-se cerca de 30% a mais entre os preços dos alimentos orgânicos e os convencionais, mas isso depende do tipo de alimento, de sua sazonalidade e do local onde é adquirido. A diferença entre os hortigranjeiros adquiridos nas feiras municipais e os convencionais não é muito expressiva, mas, no varejo, percebemos que, muitas vezes, as margens aplicadas, sobretudo nos alimentos industrializados, é muito elevada, o que encarece os produtos. Nas feiras e promoções que alguns varejistas realizam, os alimentos orgânicos ficam mais baratos.

MC: Quais os motivos para essa diferença de preços?

SW: Certificar produtos orgânicos ainda é muito caro para os pequenos agricultores, mas ao mesmo tempo eles são preparados para o desafio de uma gestão mais profissional. A agricultura orgânica não é monocultura, não é uma agricultura de grande escala. Em certas culturas, o agricultor pode requerer um pouco mais de tempo para colher a produção, o que encarece certos produtos. A produção orgânica exige mais mão de obra, sobretudo para o controle do mato, pois não é permitido o uso de herbicidas. Conforme cresce a produção orgânica, o número de produtores e a variedade de alimentos oferecidos, essa diferença tende a diminuir, e isso tem sido notado, sobretudo, nos hortigranjeiros.

MC: Quanto tempo leva para se passar da agricultura convencional para a orgânica?

SW: O tempo de conversão varia de acordo com o tipo de exploração e a utilização anterior da unidade de produção. Para a produção vegetal, devem ser respeitadas as seguintes condições:
– mínimo de 12 meses de manejo orgânico para culturas anuais, como hortaliças e grãos, por exemplo, para que a produção do ciclo subseqüente seja considerada orgânica.
– mínimo de 18 meses de manejo orgânico para culturas perenes, como frutas, por exemplo, para que a próxima safra seja considerada orgânica.
– mínimo de 12 meses de manejo orgânico ou pousio (período em que a terra é deixada sem semeadura para repousar) no caso de pastagens perenes.
Os períodos indicados poderão ser ampliados pela certificadora em função do uso anterior e da situação ecológica da propriedade. Considera-se como período máximo para conversão o prazo de quatro anos.

MC: Quais os alimentos orgânicos mais produzidos no Brasil?

SW: Os orgânicos englobam todo produto produzido de acordo com os princípios da agricultura orgânica, e vão desde sementes, hortigranjeiros, frutas, pescado, pecuária, laticínios, castanha do Brasil, castanha de caju, pães, passando por produtos industrializados, como sucos, massas, geléias, vinho, café, mel, grãos como arroz, soja, aves, cachaça, e até mesmo carne, leite ou laticínios. O Brasil produz principalmente hortigranjeiros, que podem ser adquiridos nas diversas feiras municipais, na maioria dos estados. Nos grandes varejistas, encontramos mais produtos industrializados como pães, bolos, mel, café, geléias e sucos do que hortigranjeiros e frutas, por exemplo.

POUCA OPÇÃO EM LATICÍNIOS E CARNES

MC: Quais alimentos ainda não oferecem opção ou oferecem pouca opção de produção orgânica?

SW: Ainda temos pouca opção na produção de leite e laticínios e carnes (pecuária e avicultura). A pecuária brasileira é um mercado promissor, mas gargalos como a falta de insumos e a alimentação animal dificultam seu crescimento. Apesar das dificuldades, as carnes sustentáveis, que atendem a diversos protocolos e processos de produção e de responsabilidade socioambiental, satisfazem as necessidades dos consumidores interessados em alimentos com menor impacto ambiental.

MC: Como é feita a fiscalização dos produtores certificados?

SW: No varejo somente podem ser comercializados como orgânicos os produtos que levam na rotulagem o selo de certificação. Se um produto é comercializado sem o selo, o mesmo é apreendido. Os consumidores têm o direito de fiscalizar o indicado na rotulagem e o que é comercializado nas feiras livres. Ao encontrar alguma discrepância, sugerimos pesquisar o Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos, no site do Ministério da Agricultura, criado pelo governo como mecanismo de controle da produção. A partir do ultimo trimestre de 2016, o Ministério da Agricultura começou a coletar amostras de produtos orgânicos nas feiras e no varejo de diversas cidades brasileiras. As amostras coletadas são analisadas em laboratórios credenciados e buscam identificar falhas na produção que possam levar à contaminação por substâncias não permitidas na agricultura orgânica.

MC: Quais os requisitos para que um produto industrializado receba o selo de orgânico?

SW: Temos diversos produtos industrializados como sucos, farinhas, geléias, mel, cachaça, pães, biscoitos, etc. Para que os produtos sejam considerados orgânicos, os ingredientes devem ser adquiridos de produtores devidamente certificados, e a agroindústria e o processamento também devem ser certificados. No rótulo dos alimentos deve constar o selo de certificação.

Tags: Centro de Inteligência em Orgânicos da Sociedade Nacional da AgSylvia Wachsner